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sábado, 9 de maio de 2009

A polémica proposta de Manuel Espregueira

Muito embora a comissão parlamentar constituída para analisar e apurar a questão dos adiantamentos feitos à casa Real que referi no anterior apontamento, não tivesse ainda apresentado as suas conclusões, o Ministro da Fazenda, Manuel Espregueira apresentou no Parlamento, uma proposta de lei em que tentava fixar a verba da lista civil, para a casa real.

Entre outras coisas o projecto preconizava que fosse atribuído à casa civil do rei, o valor de 1 conto de reis diário e ao seu tio o infante D.Afonso, a verba de 16 contos anuais, passando a manutenção das casas reais a ser feita pelo Ministério das Obras Públicas e as suas deslocações ao estrangeiro, bem como as despesas com a recepção a chefes do Estado em visita, a ser pagas pela Fazenda Nacional.

Também havia contrapartidas como a cedência do rei à fazenda nacional, dos palácios de Caxias, de Queluz e de Belém.

Claro que a discussão em torno desta proposta foi muito intensa sobretudo por parte da oposição corporizada pelos dissidentes e pelo republicanos, que justificavam a sua oposição à proposta por considerarem ser inoportuno discutir este assunto sem se saber os resultados da comissão de inquérito.

As discussões no parlamento, foram bastante violentas, até pelas revelações ali produzidas pelo próprio ministro, a propósito de algumas situações que aconteceram no passado, com adiantamentos que tinham sido efectuados pelo próprio,(e não só), noutras passagens que tivera à frente da Fazenda Nacional.

A polémica extravasou o Parlamento, passando para a imprensa, que viria a demonstrar que esta história dos adiantamento à casa Real, se alargava ao próprio campo da oposição, mostrando o comprometimento de todos, nesta questão incluindo republicanos e franquistas. A reacção no Parlamento de Afonso Costa apontando os nomes de todos os implicados, mas de forma tão agressiva, acabou por levar a um duelo com o conde de Penha Garcia, um dos visados.

Sobre este acontecimento, leia-se o que o poeta e jornalista Alberto Bramão descreveu no seu livro Faulhas dum Lume Vivo, publicado em 1945 postumamente, pela sua viúva

...tanto calor pôs na veemência das suas ideias (Afonso Costa) e das suas palavras, que entrou pela agressão ofensiva da dignidade dos homens que formavam os Partidos da Monarquia.

O conde de Penha Garcia estava no seu lugar de deputado; levantou-se serenamente aproximou-se do orador e disse-lhe baixinho, sem alarde, de forma que só foi ouvido pelos que estavam ao pé do orador:

- Quem assim desconsidera a honra alheia, não pode prezar a honra própria.

Afonso Costa suspendeu o discurso para responder isto simplesmente:

- Logo falaremos.

E continuou a interrompida diatribe até prefazer a hora regulamentar de oratória, incluindo os quinze minutos de tolerância.

Terminado o discurso, Afonso Costa constituiu os seus padrinhos para tratarem do duelo.

Mas, aqui começou a inquietação nos arraiais políticos, principalmente quando o chefe republicano declarou que escolhia para o combate a espada francesa.

A escolha foi considerada um acto de extraordinária coragem da parte dum homem que em esgrima era um mero aprendiz e que sabia ser o conde de Penha Garcia campeão nessa arma.

O sobressalto foi geral, nos dois campos monárquico e republicano.

Se Afonso Costa fosse mortalmente ferido, os aguerridos grupos populares, que o consideravam o mais vigoroso propagandista da ideia republicana e o chefe indispensável para derrubar a Monarquia, haviam de propalar que ele tinha sido assassinado e daí era natural desencadear-se a revolução que todos sabiam preparada para a primeira oportunidade.

Os republicanos temiam a perda do seu vigoroso líder e os monarquistas temiam as consequências tumultuosas que desse facto resultariam sem dúvida.

Houve então sobressaltadas intervenções para reduzir ao mínimo a gravidade do duelo.

O conde de Penha Garcia, não só porque no seu elevado espírito havia a consciência do que podia resultar, mas também porque não era homem para rancores, resolveu fazer todo o possível para se limitar a ferir levemente o seu adversário, de forma a cumprir apenas a formalidade que a honra impunha, sem resultado grave.

Foi-lhe, porém, difícil a realização deste propósito, porque Afonso Costa atacava com violência desvairada, atirando-se contra o antagonista, de forma que só pela serena perícia de Penha Garcia é que foi possível evitar uma desgraça, tendo terminado a contenda com um pequeno ferimento no braço do caudilho revolucionário.

Este desfecho acalmou a grande tempestade política que já se estava formando.

Reconheceu-se o procedimento generoso do mestre de armas que não quis valer-se da sua superioridade sobre o aprendiz impetuoso. Este também não sofreu humilhação, porque procedeu com nobilitante coragem e altivez.

Ficou, portanto, adiada a revolução que pouco depois proclamou na Rotunda o regime republicano.




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